STRINDBERG E O TEATRO: UMA PERFORMANCE DO AUTOR?

Camylla Galante
Universidade Estadual do Oeste do Paraná
 
 
Ao se estudar as obras dramáticas de August Strindberg, percebe-se que além de conhecer o que os teóricos de sua obra escreveram, faz-se necessário conhecer os conceitos chave por eles utilizados para melhor compreender o projeto estético desse dramaturgo, conceitos que ancoram-se no âmbito da autobiografia e das escrituras do eu. Magaldi (2001) escrevia que o pensamento e a obra de Strindberg encontram-se tão intimamente entrosados e decorrem de uma tão marcada expressão individual que é impossível separá-los em compartimentos estanques. Bentley, por sua vez, escreveu que “a arte era uma espécie de autoindulgência sublime para Strindberg, a autobiografia e a história, uma autodisciplina” (Bentley 242). Como se pode, então, conceber o uso do termo “autobiografia” quando se refere à obra dramática de Strindberg se, por outro lado, nem sempre os elementos biográficos que serviram de inspiração à sua produção teatral são reconhecidos?

Inicia-se a compreensão destes termos com a definição literal do vocábulo: a “vida de um indivíduo escrita por ele próprio”. Essa é a definição de autobiografia proposta no dicionário Larousse em 1886, citada por Lejeune (2008), e que se volta ao sentido desta palavra. Palavra derivada do grego, Maria Aparecida Rodrigues apresenta seu significado literal, que se constrói por suas partes: autos = próprio; bios = vida; e graphein = escrita (Rodrigues 19). No entanto, este gênero sofreu expressivas mudanças desde suas primeiras aparições e sua definição tornou-se controversa.

Para Bakhtin (1988), os escritos biográficos surgiram na Grécia Antiga, com os diálogos de Platão sobre Sócrates, nos quais o filósofo Platão não narra simplesmente os eventos da vida de Sócrates, mas sim “o caminho do indivíduo que busca o verdadeiro conhecimento” (Bakhtin 250). Houve ainda discursos fúnebres e laudatórios que substituíram o antigo lamento (Bakhtin 251).  Outros estudos lembram que “entre os romanos existiram escritos autobiográficos familiares, que tinham como finalidade a transmissão das tradições familiares e patriarcais” (Rodrigues 53).

Um segundo momento da autobiografia acontece na idade média, com as Confissões (397-398 d.C), de Santo Agostinho e História das Minhas Calamidades(1121), livro de memórias de Pedro Abelardo. Apesar dessas obras se aproximarem consideravelmente da forma atualmente concebida como autobiografia, de um discurso individual, no qual os autores escrevem sobre sua vida, este discurso ainda carrega em si as características dos textos e discursos biográficos e autobiográficos do período clássico: a descrição de um trajeto em busca da sabedoria, ou no caso de Agostinho, o seu caminho até se tornar um cristão exemplar; o segundo modelo é o discurso autobiográfico de defesa, que é utilizado por Abelardo para justificar-se e escrever a versão de sua própria conturbada história. Além disso, há ainda o caráter público destas declarações. Nesse período não havia, ainda, a subjetividade do eu que passou a ser desenvolvida a partir do Renascimento, passando a ganhar maior relevância no Iluminismo com o início da Revolução Industrial e com o desenvolvimento da burguesia e do sentido de família (pai, mãe e filhos) como um núcleo fechado. Diz Rodrigues ao citar a obra do teórico Maurizio Catani1:

Catani concebe a idéia de que há uma íntima e evidente correlação entre o afirmar-se da literatura autobiográfica e a ascensão da burguesia como classe dominante, cujo individualismo e cuja concepção de pessoa encontram na autobiografia um dos meios adequados de manifestação (Rodrigues 20).

Os textos tidos por Bakhtin como precursores da autobiografia não refletem a subjetividade do autor, eles apenas trazem o percurso realizado pela personagem biografada em um aspecto da sua vida, que serviriam como modelo de conduta em uma determinada ocasião ou com uma determinada pretensão como, por exemplo, mostrar o caminho trilhado por Sócrates até o conhecimento, sendo somente um modelo de busca pela sabedoria, e o modelo de Santo Agostinho como exemplo do cristão ideal. É nisto que consiste o caráter dito pedagógico por Bakhtin:

A conscientização do homem apóia-se, aqui, somente sobre os aspectos de sua personalidade e de sua vida que são voltados para o exterior, concernentes tanto aos outros como a si próprio, sendo que apenas neles a consciência procura seu apoio e sua unidade, ela não conhece absolutamente outros aspectos intimamente pessoais, ‘por si só’, individuais e irrepetíveis. Daí o caráter específico, normativo e pedagógico dessa primeira autobiografia (Bakhtin 255).

Foi no período do Iluminismo que um dos seus principais representantes, Jean-Jacques Rousseau, deu início à autobiografia de caráter subjetivo com o livroConfissões (1764-1770), obra considerada como o marco da literatura autobiográfica por alguns autores, ligada ao “eu” do autor, e que se manifesta ainda hoje nos escritores contemporâneos. Foi este filósofo o primeiro a escrever voltado para si, como uma espécie de solilóquio mudo, interior, sem considerar os aspectos sociais (exteriores) da sua vivência. A escrita de Rousseau é voltada ao seu “eu”, não pautada no racional, mas no aspecto subjetivo de sua vida, um retorno a si mesmo:

Com Rousseau, a autobiografia confessional passa a ser de domínio exclusivo da existência privada. Enquanto a interioridade agostiniana fundamentava-se na racionalidade para explicar a verdade religiosa, […] na obra confessional de Rousseau, ao contrário; a interioridade baseia-se no sentimento, considerado por ele superior à razão e relacionado ou equivalente à natureza. Isso significa atribuir distinção à existência privada, pois o sentimento passa a ser a medida da interioridade do homem. Confissões (1988), de Rousseau, é um escrito autobiográfico autêntico, no sentido próprio do termo: um voltar-se sobre si mesmo (Rodrigues 70).

Desta forma, com a ascensão burguesa e a influência das teorias idealistas dos filósofos modernos e com o início da individualização do homem, a autobiografia deixou de versar sobre a vida pública de determinada personagem e passou a ser representação do eu interior de cada autor, a expressão da sua subjetividade. A autobiografia não pode ser compreendida sem que seja considerado o seu contexto, atemporalmente, pois este gênero acompanha a noção de indivíduo que se tem a partir do Renascimento. Na antiguidade não seria possível considerar alguns relatos como autobiográficos, pois não havia, naquela época, a noção de indivíduo que se “construiu” a partir do Humanismo. Alguns teóricos consideram a autobiografia um gênero atemporal, pois pensam nas memórias e nas confissões de Santo Agostinho, que viveu na alta Idade Média, e Abelardo, filósofo do fim da era medieval. Na antiguidade não se tinha consciência do “eu”; na Idade Média, “a observação e a descrição do mundo externo desaparecem por completo atrás da representação de fatos e experiências espirituais” (Lima 255).

Tendo isto em vista, é a partir dos escritos do século XVIII que Philippe Lejeune analisa a questão da autobiografia e propõe a tese do “pacto autobiográfico”.
 
1. Lejeune e os Pactos de Leitura

No texto “O pacto autobiográfico” (Lejeune 14), Lejeune define o termo “autobiografia” e o distingue de outras formas de “escritas do eu” existentes como memórias, biografia, poema autobiográfico, diário etc. Apesar de estas formas narrativas serem, também, escritas que possuem teor autobiográfico, elas não encerram em si todas as características necessárias da autobiografia. O teórico francês define o gênero autobiográfico como uma “narrativa retrospectiva em prosa que uma pessoa real faz de sua própria existência, quando focaliza sua história individual, em particular a história de sua personalidade” (Lejeune 14), e nesta narrativa deve haver “relação de identidade entre o autor, o narrador e o personagem” (Lejeune 15). Além desta relação identitária, a obra deve ser uma narrativa, em prosa, escrita em primeira pessoa e o nome da personagem principal, caso apareça, deve ser necessariamente idêntico ao nome do autor que está estampado na capa do livro.

Apesar de considerar a narrativa em primeira pessoa como sendo, de certa maneira, o formato ideal de um relato autobiográfico, Lejeune admite que existam obras nas quais a terceira pessoa seja empregada, e que este recurso faz com que o texto adquira um efeito de sentido diverso daquele da escrita em primeira pessoa. Quando escrito em terceira pessoa, o que ocorre é um distanciamento entre o autor e a personagem, que pode criar um efeito irônico (e talvez cômico) ou de orgulho ou humildade, dependendo de como o narrador descreve a personagem e do modo como o texto se desenvolve. Nas narrativas em terceira pessoa o princípio de identidade entre autor e personagem para que o escrito seja considerado autobiográfico deve ser o mesmo: o nome do protagonista deve ser idêntico ao do autor do livro. Após apontar as possíveis variações na “forma autobiográfica ideal” e ainda assim considerando-as como escritos autobiográficos, Lejeune diz que a questão central da autobiografia reside na discussão da utilização do nome próprio. Diz o autor:

É, portanto, em relação ao nome próprio que devem ser situados os problemas da autobiografia. Nos textos impressos, a enunciação fica inteiramente a cargo de uma pessoa que costuma colocar seu nome na capa do livro e na folha de rosto, acima ou abaixo do título. É nesse nome que se resume toda a existência do que chamamos de autor: única marca no texto de uma realidade extratextual indubitável, remetendo a uma pessoa real, que solicita, dessa forma, que lhe seja, em última instância, atribuída a responsabilidade da enunciação de todo o texto escrito (Lejeune 23).

O teórico diz ainda que a presença do autor muitas vezes se resume ao nome presente na capa do livro, mas que este lugar concedido a esse nome é capital. Este nome é o que vai atestar a existência real e verificável do autor, firmando assim um contrato social, no qual o autor atesta a sua existência e a veracidade de seus escritos (Lejeune 23). Há, entretanto, narrativas em que a personagem central carrega um nome diferente do autor, mas que, no entanto, no momento da leitura se reconhecem elementos de sua vida, identificados seja por comparação a outras obras suas ou por informações acerca de sua vida, que levem a crer que aquela história seja a história do autor. Porém, como não há indicações dadas diretamente pelo escritor, toma-se o texto como ficção, mesmo com as suspeitas do leitor.

Esses textos entrariam na categoria do ‘romance autobiográfico’. Chamo assim todos os textos de ficção em que o leitor pode ter razões de suspeitar, a partir das semelhanças que acredita ver, que haja identidade entre o autor e personagem, mas que o autor escolheu negar essa identidade ou, pelo menos, não afirmá-la. Assim definido, o romance autobiográfico engloba tanto narrativas em primeira pessoa (identidade do narrador e do personagem) quanto narrativas ‘impessoais’ (personagens designados em terceira pessoa); ele se define por seu conteúdo (Lejeune 25).

Entre a autobiografia declarada, seja em primeira ou em terceira pessoa, e o romance autobiográfico, há “níveis de veracidade” que são determinados pelo autor por meio de “pactos” feitos com o leitor. A partir do momento em que a personagem principal possui o mesmo nome que o autor ou mesmo que o nome do protagonista não seja mencionado, mas que o autor tenha deixado claras as suas intenções (que aparecerão em alguma parte do livro, por trás da palavra “autobiografia” impressa ou de alguma outra expressão que a substitua), ocorre o que Philippe Lejeune chama de “pacto autobiográfico”. Realizado este pacto, o autor tem a “obrigação” de dizer a verdade e somente a verdade, e tal pacto vale tanto para os textos em primeira quanto em terceira pessoa. Caso não haja alguma identificação, a personagem não carregue o mesmo nome do autor, tem-se o “pacto romanesco”, no qual o autor atesta que aquilo que está escrevendo não passa de ficção. A diferença entre a autobiografia (que pode ser em terceira pessoa) e o romance autobiográfico é somente o pacto autobiográfico, que, segundo Lejeune,

[…] só é correto quando nos limitamos ao texto, sem considerar a página do título, pois desde o momento em que a englobamos ao texto, com o nome do autor, passamos a dispor de um critério textual geral, a identidade do nome (autor-narrador-personagem). O pacto autobiográfico é a afirmação, no texto, dessa identidade, remetendo, em última instância, ao nome do autor, escrito na capa do livro (26).

Pode-se dizer também que a diferença entre o romance autobiográfico e a biografia e a autobiografia é que os dois últimos são textos referenciais, pois tais textos se propõem a fornecer informações sobre a “realidade” externa ao texto, o que pode ser verificado:

Seu objetivo não é a simples verossimilhança, mas a semelhança com o verdadeiro. Não o ‘efeito de real’, mas a imagem do real. Todos esses textos referenciais comportam então o que chamarei de pacto referencial, implícito ou explícito, no qual se incluem uma definição do campo do real visado e um e enunciado das modalidades e do grau de semelhança aos quais o texto aspira (Lejeune 36).

Há ainda textos aos quais Lejeune atribui outro tipo de pacto: o pacto fantasmagórico. O teórico, ao falar das afirmações de André Gide e François Mauriac sobre a superioridade da ficção em relação à autobiografia (“Só a ficção não mente; ela entreabre na vida de um homem uma porta secreta, por onde se insinua, fora de qualquer controle, sua alma desconhecida” (Lejeune 42)), diz que, caso o romance fosse verdadeiramente superior e/ou mais verdadeiro do que a autobiografia, estes autores não teriam também escrito textos autobiográficos. Por tê-los escritos, eles acabam “entregando” qual a verdade que deve ser buscada em suas obras: a verdade do autor: “O leitor é assim convidado a ler os romances não apenas como ficções remetendo a uma verdade da ‘natureza humana’, mas também como fantasmas reveladores de um indivíduo. Denominarei essa forma indireta de pacto autobiográfico pacto fantasmagórico” (Lejeune 43). E Lejeune completa:

Visto sob esse ângulo, o problema muda completamente de natureza. Não se trata mais de saber qual deles, a autobiografia ou o romance, seria o mais verdadeiro. Nem um nem outro: à autobiografia faltariam a complexidade, a ambigüidade etc.; ao romance, a exatidão. Seria então um e outro? Melhor: um em relação ao outro. O que é revelador é o espaço no qual se inscrevem as duas categorias de textos, que não pode ser reduzido a nenhuma delas. Esse efeito de relevo obtido por esse processo é a criação, para o leitor, de um ‘espaço autobiográfico’ (43).

O espaço autobiográfico abarcaria todos os tipos de textos e os pactos propostos por Lejeune. Os textos que não possuem indicação de que o seu conteúdo remeta à vida do autor, mas que os leitores reconhecem elementos como sendo parte da biografia do escritor, localizam-se neste “espaço autobiográfico”, no qual, pode-se dizer, há um “pacto indireto”, “implícito”, que permeará tais obras.
 

2. Klinger e a autobiografia como performance

Após fazer um breve levantamento das ideias acerca da autobiografia e outros gêneros afins de Philippe Lejeune, de Costa Lima e de outros autores, Diana Klinger, no livro Escritas de si, escritas do outro (2001), no capítulo A autoficção no campo da escrita de si, trata do termo autoficção cunhado pelo crítico e romancista francês Sergue Doubrovsky com referência ao romance que escreveu, no qual “o narrador tem o nome do autor, apesar de suas peripécias serem fictícias” (Klinger 47). Doubrovsky escreveu este livro em resposta às teorias de Lejeune nas quais uma obra com tais características seria uma lacuna nos escritos de cunho autobiográfico criados e analisados até então. Para Doubrovsky, a autoficção não é “nem autobiografia nem romance, e sim, no sentido estrito do termo, funciona entre os dois, em um re-envio incessante, em um lugar impossível e inacessível fora da operação do texto” (Doubrovsky apud Klinger 47).

Mesmo criado a partir de uma obra em particular e o autor ter cunhado a sua definição, o termo “autoficção” passou a ser utilizado por outros estudiosos e passou a ser, também, contestada e a ter outras definições atribuídas ao termo. Dos exemplos trazidos por Klinger desta contestação, o de Philippe Gasparini, partindo da relação autor, narrador e herói, distingue a autobiografia fictícia, o romance autobiográfico (ou ficção autobiográfica) e a autoficção da autobiografia apenas por esta ser necessariamente dependente de um pacto referencial e aqueles não. “Nos discursos autobiográficos ficcionais pode haver – como deve haver na autobiografia ‘autêntica’ – identidade onomástica entre o autor, o narrador e o personagem” (Gasparini apud Klinger 45). No entanto, este critério não é suficiente para distinguir estes tipos de texto, outros meios devem ser usados para que a “verdade” sobre o autor possa ser verificada, como idade, meio socioeconômico etc., por meio dos quais seja possível identificar possíveis semelhanças e diferenças entre personagem, narrador e autor. Desta forma, como ambos, autoficção e romance autobiográfico, não são considerados textos referenciais, para Gasparini, segundo Klinger, o que os distingue é o grau de ficcionalidade, sendo o romance autobiográfico mais verossímil que a autoficcção:

A diferença entre ambas reside nos elementos que permitem ao leitor fazer uma validação da identificação, quer dizer, no nível da verossimilhança. O romance autobiográfico se inscreve na categoria do possível, do verossimilmente natural, ele suscita dúvidas sobre sua verificabilidade mas não sobre sua verossimilhança; enquanto que a autoficção mistura verossimilhança com inverossimilhança e assim suscita dúvida tanto a respeito da sua verificabilidade quanto da sua verossimilhança (Klinger 46).

Ou seja, o romance autobiográfico é ambíguo, pois apesar de ser um romance (o que leva o crítico a pensar no pacto romanesco, logo ficcional) é o fundo autobiográfico que permeará a obra, que pode trazer elementos verídicos para o escrito. A autoficção, por sua vez, é, segundo Gasparini, menos ambígua pois,  “se o pacto do romance autobiográfico é ambíguo, pois ele possui índices de identificação contraditórios, ao ser puramente ficcional, pois existe sempre algum elemento que corroa a verossimilhança interna no romance” (Klinger 46-47).

Outra definição de autoficção que Klinger aponta em seu texto é de Jacques Lecarme, que pôs em dúvida a “novidade” da autoficção apresentada no romance de Doubrovsky, dizendo que tal “modelo” de obra já havia sido utilizado por André Malraux e Louis-Ferdinand Celine, por exemplo. Para Lecarme, a autoficção é “um dispositivo muito simples: um discurso no qual o autor, o narrador e o protagonista têm a mesma identidade nominal e no qual o título genérico indica que se trata de um romance” (Klinger 47), definição que não se afasta daquela proposta por Gasparini. Ambas as definições acabam por reduzir o conceito de “autoficção” simplesmente ao de ficção. Os exemplos trazidos por Klinger mostram que o termo autoficção é compreendido por alguns autores como sendo simplesmente um texto ficcional que se apresenta como real, uma realidade inventada sobre o autor, sem qualquer relação com o real. Para a autora do livro, por sua vez, o problema da autoficção vai mais além do que simplesmente a questão da identidade ou não entre autor, narrador e protagonista. Klinger acredita que “a categoria de autoficção implica não necessariamente uma corrosão da verossimilhança interna do romance, e sim um questionamento das noções de verdade e sujeito” (47).

Ao escrever algo que pode ser compreendido no que Lejeune define como “espaço autobiográfico”, tanto no romance autobiográfico quanto na autoficção, as “verdades” que se têm no texto são as verdades do autor, ou ao menos aquelas expostas por ele ou aquilo que quer que seja sua verdade. O que se mostra é uma de suas máscaras, a “preferida”, que permanecerá por meio de sua obra.

Nos textos com fundo autobiográfico há uma construção da personagem-autor, por mais que isso não esteja explícito. Constrói-se o sujeito e a sua “verdade-fictícia”. A verdade utilizada pelo autor não possui um referencial ao qual o leitor possa recorrer para verificar a procedência, a veracidade daquilo que foi escrito: “Confundindo as noções de verdade e ilusão, o autor desafia a capacidade do leitor de ‘cessar de descrer’. Assim, o que interessa na autoficção não é a relação do texto com a vida do autor, e sim a do texto como forma de criação de um mito, o mito do escritor” (Klinger 50).

Noção de mito utilizada aqui por Klinger é a proposta por Roland Barthes, que parte da estrutura ternária do conceito de signo de Saussure. A autora escreve que, de acordo com Barthes, na teoria freudiana, “o significante é constituído pelo conteúdo manifesto de um comportamento, enquanto que o significado é seu sentido latente. O terceiro termo é a correlação entre os dois primeiros” (Barthes apud Klinger 50). Tendo as concepções do signo saussuriano e a forma do inconsciente de Freud, Barthes afirma, segundo Klinger, que a criação do mito partilha deste mesmo esquema tridimensional e que se

Constrói a partir de uma idéia semiológica que lhe preexiste no sistema da língua: o que é signo (junção de três termos) no primeiro sistema é significante (primeiro termo) no segundo. O signo, termo final do sistema da língua, ingressa como termo inicial no segundo sistema, mitológico. Barthes chama a esse signo (significante no segundo sistema) de ‘forma’ e ao significado de ‘conceito’. O terceiro termo, no sistema do mito, é significação (Klinger 50).

O mito, completa Barthes, está mais para o inconsciente freudiano do que para o signo linguístico, pois, neste último, o significante é “vazio e arbitrário” e não dá sustentação ao significado. O sentido, o significado do mito depende do significante: “assim como para Freud, o sentido latente do comportamento deforma seu sentido manifesto, assim no mito o conceito deforma o sentido” (Klinger 50-51). Para Klinger a matéria da autoficção não é a biografia, mais o mito do escritor:

A autoficção participa da criação do mito do escritor, uma figura que se situa no interstício entre a ‘mentira’ e a ‘confissão’. A noção do relato como criação da subjetividade, a partir de uma manifesta ambivalência a respeito de uma verdade prévia ao texto, permite pensar […] a autoficção como uma performance do autor (51).

Ao considerar a autobiografia como uma performance do autor, o que muda é a compreensão do conceito de verdade que está implícito quando se trata de gêneros autobiográficos. Aqui, a noção de verdade não se mescla mais com a noção de fato, como na biografia e na autobiografia, pois a verdade empregada é aquela “criada”, “acreditada” pelo autor. No entanto, assim como numa performance artística na qual o ator está por trás da “máscara” da personagem, dando “sustentação” a ela, assim é o autor na autoficção: ela é uma representação da vida do autor, uma ficção, porém a biografia “real” do escritor dará suporte a esta dramatização. Não há, portanto, uma anulação de uma das partes, mas a sobreposição da personagem e do autor, pois, como nas performances artísticas, mesmo quando representa e veste a máscara da personagem, o ator não deixa de ser ele mesmo, a personagem é sobreposta a ele. Klinger afirma que:

Desta perspectiva, não haveria um sujeito pleno, originário, que o texto reflete ou mascara. Pelo contrário, tanto os textos ficcionais quanto a atuação (a vida pública) do autor são faces complementares da mesma produção de uma subjetividade, instâncias de atuação do eu que se tencionam ou se reforçam, mas que, em todo caso, já não podem ser pensadas isoladamente. O autor é considerado como sujeito de uma performance, de uma atuação, um sujeito que ‘representa um papel’ na própria ‘vida real’, na sua exposição pública, em suas múltiplas falas de si, nas entrevistas, nas crônicas e auto-retratos, nas palestras (55).

Ou seja, o autor constrói sua personagem não só em seus livros, mas também na sua vida cotidiana, na qual ele “encarna” o papel de escritor com o qual se apresenta publicamente. Nos livros o que se tem é a transposição desse “papel de escritor” utilizado normalmente, a transposição de sua vida para a narrativa. Para Klinger citando Arfuch portanto,

O que interessa do autobiográfico no texto de autoficção não é uma certa adequação à verdade dos fatos, mas sim ‘a ilusão da presença, do acesso do lugar de emanação da voz’ (Arfuch, 2005, p. 42). Assim, a autoficção adquire outra dimensão que não a ficção autobiográfica, considerando que o sujeito da escrita não é um ‘ser’ pleno, senão que é resultado de uma construção que opera tanto dentro do texto ficcional quanto fora dele, na ‘vida mesma’ (55).

Desta forma, considerando a posição de Klinger acerca da autoficção, pode-se perceber que esta não pode ser considerada simplesmente como um texto de ficção, pois deve-se levar em conta a intencionalidade do autor nestes casos, ou seja, a intenção de criar um mito de si, sua performance. Mesmo que não possa ser considerada fidedigna e passível de ter sua veracidade confirmada, a autoficção possui a biografia e o próprio autor como sustentação para tal, o que faz com que não se possa tomá-lo como puramente ficção.
 

3. Strindberg, os pactos e a performance

Ao considerar as teses de Lejeune e Klinger, pode-se compreender melhor o projeto estético de Strindberg. Apesar dos textos destes teóricos tratarem exclusivamente de romances, acredita-se que suas proposições possam dar conta de explicar o viés autobiográfico tanto dos romances quanto das peças do dramaturgo sueco.

No conjunto da obra de Strindberg pode-se atribuir o pacto romanesco proposto pelo teórico francês aos seus romances autobiográficos, pois as personagens principais não levam o nome do autor e são escritos ora em primeira ora em terceira pessoa. Aparentemente era essa a intenção de Strindberg ao escrever romances como A defesa de um louco (1887), Ele e ela (1887), Inferno (1897), Lendas (1897-1898) e Sozinho (1903) (Strindberg, The Son 11-13), pois, apesar de serem romances, o conteúdo autobiográfico permeia toda a produção.  Além disso, Michael Robinson aponta em seu livro Strindberg and Autobiography o quanto o escritor sueco se vale da imaginação na composição de suas obras ditas autobiográficas. Robinson traz um trecho no qual Strindberg escreve em uma carta a sua esposa Siri von Essen “Of course, you have the freedom to use your imagination”2 (Robinson 7),  dando a entender que a imaginação seria um “disfarce protetor” para eventos que teriam acontecido a pouco tempo da escritura das obras e também para as pessoas envolvidas nestes eventos. Robinson completa dizendo que

Otherwise, however, at least until after he develops a modernist aesthetic during the Inferno period, Strindberg continues to maintain that ‘the imagination, which has been regarded as creative, that is to say, able to make something out of nothing, is only the gift of organization, which arranges the memory’s greater of lesser wealth of impressions and puts each of them in its place’3 (Robinson 7).

Ademais, Robinson cita Erik Hedén quando este diz que os escritos autobiográficos de Strindberg são “clearly designed with an artistic aim4” (Robinson 7), o que indica que, apesar do escritor ter a clara intenção de escrever sobre suas vivências em seus romances, muito do que está dito nestas obras que não é fiel à biografia do autor, elas são, acima de tudo, produções artísticas que, caso fossem fielmente escritas segundo a vida de Strindberg, diferenciar-se-iam do projeto estético proposto pelo dramaturgo. Essa diferença se daria pelo fato de que o dramaturgo cria em torno de si e de sua história elementos que dão uma nova realidade e uma nova significação para a sua existência que não existiam anteriormente.

Strindberg não se utiliza da imaginação somente na criação de seus romances autobiográficos anteriores de Inferno, como também (e, sobretudo) na tessitura de suas peças, principalmente naquelas denominadas dramas de estação, escritas em seu período pós-Inferno. Aos conhecedores da biografia de Strindberg ou àqueles que leram seus romances autobiográficos, é flagrante o fundo autobiográfico em seus protagonistas, por conta da caracterização destes e do conteúdo expresso em suas peças. Quanto a isso Michael Robinson aponta que “[…] perhaps not so extraordinary to recall that, until recently, it was an accepted practice in Sweden for the actor who played The Unknown in To Damascus to wear a mask representing Strindberg’s features” 5 (Robinson 7).

Rumo a Damasco foi escrita um ano após Inferno, e as experiências relatadas neste romance autobiográfico parecem ter sido reproduzidas e ficcionalizadas pelo dramaturgo na peça. Entretanto, Strindberg não deixa claro em nenhum momento que a sua produção dramática encerrasse qualquer elemento de sua biografia, porém tal característica é destacada pelos estudiosos de sua obra. Além disso, Strindberg costumava dizer que somente é possível conhecer a fundo a própria vida, como na entrevista que se encontra na introdução de The son of a servant:

[…] I think that the life of a single individual described in length and depth is truer and more enlightening than the life of a whole family. How can one know what I going on in someone else’s mind? How can one know the complicated motives behind someone else’s acts? How can one know what someone else said in an intimate moment? One can’t. One fabricates, makes it up. But up to now anthropology, the scientific study of man, has not been much cultivated by writers, who with their scrappy knowledge of psychology have attempted to  describe the all-too-obscure life of the soul. There’s only one person’s life that we really know and that one is our own (Strindberg, The Son 23).6

Partindo destas características, pode-se dizer que Strindberg assinou o pacto fantasmagórico proposto por Lejeune ao que se refere às suas peças, já que nestas obras ficcionais não há qualquer referência direta de que há traços de sua biografia e pelo fato do autor ter escrito diversos romances autobiográficos, cada um sobre um determinado período de sua vida. Porém, mesmo que a peça possa ser incluída sob a classificação do pacto fantasmagórico, ela não deixa de também ser caracterizada como autoficção e como uma performance do autor por meio da personagem do Desconhecido e também das personagens do Mendigo e do Louco, pois estas são emanações daquela e, juntas, constituem períodos da vida do autor. Segundo Szondi, em seu Teoria do Drama Moderno,

O passado lembrado e interiorizado se apresenta na reflexão na qualidade de presente estranho: os estranhos com que depara o Desconhecido são freqüentemente sinais de seu próprio passado. Na figura do médico, por exemplo, há a citação de um colega de escola que foi injustamente punido em seu lugar; no encontro com ele se presentifica a origem do remorso que desde então não mais o abandonou (motivo que Strindberg tirou de sua biografia). E o mendigo que entrona na esquina da rua apresenta a seus olhos a cicatriz que ele mesmo traz, a marca de um golpe que recebera de seu próprio irmão (Szondi 63).

Sua peça O Sonho, escrita três anos após Rumo a Damasco, também pode ser classificada como parte do pacto fantasmagórico e da performance de Strindberg. Apesar de a protagonista ser uma mulher, as personagens que ela encontra em seu caminho possuem características do dramaturgo e suas histórias se assemelham com aquela de seu criador, como as personagens do Mestre de Quarentena, do Advogado, do Oficial e do Poeta. Segundo Evert Sprinchorn, na introdução da versão em inglês de The son of a servant, há um conto de Strindberg intitulado The Quarantine Master’s Second Tale, no qual o autor escreve a história de seu casamento com Frida Uhl, sua segunda esposa (Strindberg, The Son 12). Ainda neste romance, que o dramaturgo escreve em terceira pessoa, o protagonista, que seria o pequeno Strindberg, ora é chamado John, ora de Axel, da mesma forma que a personagem Inês chama a personagem d’O Advogado em um trecho da obra O Sonho: “Inês: Por favor, Axel, não me fales num tom assim tão busco.” (Strindberg, O Sonho 96).

Ainda nesta peça pode-se encontrar uma referência ao romance Inferno, no período em que passou em Paris, quando se intoxicou com enxofre ao realizar experiências que comprovassem a existência de carbono em tal elemento, o que deixou suas mãos negras e sangrentas:

Continuo, entretanto, com as experiências, enquanto se apostemam as feridas de minhas mãos cheias de fissuras em que se acumula o pó de carvão. […] Meus aparelhos são insuficientes, não tenho mais dinheiro, minhas mãos estão negras e sangrentas. Negras como a miséria, sangrentas como meu coração (Strindberg, Inferno 33).

No drama, o Advogado, ao lamentar-se para Inês, diz:

O ADVOGADO: […] Olha para mim! Aqui, ninguém sorri, só se vêem olhares maus, bocas que fazem esgares, punhos que se estendem… Todos! Despejam sobre mim a sua maldade, a sua inveja, as suas desconfianças!… Olha!… As minhas mãos estão negras… já não se podem lavar! Repara em como estão todas gretadas, e como sangram… […] Por vezes, queimo enxofre para purificar o ar deste escritório, mas isso não serve de nada! (Strindberg, O Sonho 73-74).

Deste mesmo episódio das feridas nas mãos por conta de suas experiências, pode-se fazer uma relação com o personagem do Mendigo de Rumo a Damasco. Em Inferno, Strindberg relata que, estando sem dinheiro, é internado com a caridade de amigos e conterrâneos, o que lhe perturba enormemente, e ele refere-se a si mesmo como mendigo. Ollén (Ollén 9) diz que, o evento da vida de Strindberg que dá sustentação à personagem do mendigo pode ser representado no seguinte trecho do Inferno:

Mendigo! A crua palavra me fere os ouvidos, queimando-me as faces de vergonha, humilhação e raiva. Imaginem isso! Há seis semanas atrás eu ocupava uma mesa nesse café: o diretor de minha peça, a meu convite, bebia comigo, chamando-me de caro mestre; os jornalistas vinham pedir entrevistas, o fotógrafo queria ter a honra de vender meus retratos… E agora, mendigo, marcado, banido da sociedade! (Strindberg, Inferno, 41).

Em Rumo a Damasco, este papel, esta sensação de estar à margem da sociedade na qual se encontra, é representado por Strindberg na figura do Mendigo. Na peça, Desconhecido, reconhece-se na personagem do Mendigo, que, desta forma, passar a  constituir uma das performances do autor na peça, juntamente com o protagonista, e o Louco (César):

O DESCONHECIDO: Olá, aí está o mendigo fuçando de novo.
O MENDIGO: […] Chefe! Uma garrafa de vinho branco!
DONO DO CAFÉ: (Vem com um documento) Fora! Não vai conseguir nada aqui. Você não pagou impostos. Aqui está o seu prontuário, seu nome, sua idade e seu caráter.
O MENDIGO: Omnia serviliter pro dominatione . Eu sou um homem livre, com educação universitária e recusei-me a pagar impostos porque não desejo me engajar na sociedade.
DONO DO CAFÉ: Se você não sumir daqui, vai ganhar uma estadia grátis na cadeia.
[…] O DESCONHECIDO: Acho a coisa toda uma idiotice. Será que um homem não pode aproveitar os pequenos prazeres da vida só porque ele não pagou os impostos?
DONO DO CAFÉ: Já vi tudo! Você é um desses que andam por aí dizendo ao povo que esqueçam suas responsabilidades.
O DESCONHECIDO: Isso já é ir longe demais. Você sabe que eu sou famoso?
[…] DONO DO CAFÉ: Famoso, mas que nada! Espere um pouco. Deixe eu ver. Esta descrição pode servir. (Lê o documento) Trinta e oito anos de idade, cabelo castanho, olhos azuis, sem ocupação definida, abandonou a mulher e os filhos, tem posição subversiva sobre questões sociais e dá a impressão de não estar de posse de seus sentidos. Não se ajusta?
O DESCONHECIDO (Levanta pálido e aniquilado) O que é isso?
DONO DO CAFÉ: Deus me ajude, mas isto serve.
O MENDIGO: Talvez seja ele e não eu.
DONO DO CAFÉ: Parece mesmo. Agora, por que você não se manda?
O MENDIGO: (Para o Desconhecido) É melhor a gente ir.
O DESCONHECIDO: A gente? Isto está me parecendo uma conspiração. (Strindberg, Rumo 27-28).

Pode-se verificar nestes excertos que Strindberg, em seus dramas, se utiliza de eventos de sua biografia para pôr-se em suas personagens e não somente nos protagonistas. Tanto em Rumo a Damasco como em O Sonho o autor ficcionaliza seus dados autobiográficos e se projeta nas personagens, atribuindo a si diversas máscaras, que corresponderiam aos “Strindbergs” que o dramaturgo gostaria de perpetuar. Ele é o Desconhecido, o Mendigo e o Louco, mas também o Advogado, o Poeta, o Oficial e o Mestre de Quarentena e, desta forma, o dramaturgo sueco cria o que Klinger denomina o mito do escritor. Neste interstício de verdade e mentira (ou ficção), temos a performance de Strindberg, ou seja, a verdade pela qual ele quer ser conhecido. E, de fato, a imagem que se tem até hoje do dramaturgo é a do louco, do estrangeiro em seu próprio país e do misógino. No fundo, Strindberg gostaria apenas de ter seu gênio e suas obras reconhecidas por seus contemporâneos, mas que, todavia, só ocorreu após a sua morte.

 
 
Notas

1 Catani, Maurizio; Delhez-Sarlet, Claudette (Org.). Individualisme et autobiographie em occident. Bruxelles: l’Université de Bruxelles, 1983.

2 É claro que você tem a liberdade para usar a sua imaginação. (todas as traduções são de nossa autoria).

3De outra forma, contudo, pelo menos até ele [Strindberg] desenvolver a estética modernista durante o período de Inferno, Strindberg continua a afirmar que ‘a imaginação, a qual tem sido considerada como criativa, ou seja, capaz de fazer algo do nada, é somente o dom da organização,que arranja a maior das menores riquezas de impressão da memória e coloca cada coisa em seu lugar.

4 Claramente concebidos com um objetivo artístico.

5 […] talvez não tão extraordinário pra recordar, até recentemente, era uma prática aceita na Suécia para o ator que interpretasse o Desconhecido em Rumo a Damasco o uso de uma máscara representando as características de Strindberg.

6 Eu penso que a vida de cada um descrita integralmente é mais verdadeira e mais esclarecedora do que a vida de uma família inteira. Como alguém pode saber o que se passa na mente de outra pessoa? Como alguém pode conhecer os complicados motivos por trás das ações de outra pessoa? Como alguém pode saber o que outra pessoa disse num momento íntimo? Ninguém pode. Alguém fabrica, inventa. Mas até agora a antropologia, o estudo científico sobre o homem, não foi muito cultivada pelos escritores, aqueles que com seu conhecimento fragmentado de psicologia tentaram descrever toda a obscuridade da alma. Só se pode conhecer realmente uma vida, a sua própria.
 
 
Referências

Bakhtin, Mikhail. Questões de literatura e de estética. A teoria do romance. São Paulo: UNESP/Hucitec, 1988.

Bentley, Eric. O dramaturgo como pensador. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1991.

Klinger, Diana. Escritas de si, escritas do outro: o retorno do autor e a virada etnográfica: Bernardo Carvalho, Fernando Vallejo, Washington Cucurro, João Gilberto Noll, César Aira, Silviano Santiago. Rio de Janeiro: 7Letras, 2007.

Lejeune, Philippe. O pacto autobiográfico: de Rousseau à Internet. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008.

Lima, Luiz Costa. Sociedade e discurso ficcional. Rio de Janeiro: Guanabara, 1986.

Magaldi, Sábato. O texto no teatro. São Paulo: Perspectiva, 2001.

Ollén, Gunnar. Introduction. In: Strindberg, August. The road to Damascus. Teddington: The Echo Library, 1958.

Robinson, Michael. Strindberg and Autobiography. Writing and Reading a Life. Norwich: Norvik Press, 1986.

Rodrigues, Maria Aparecida. O discurso autobiográfico ficcional. Goiânia: UCG, 2007.

Strindberg, August. Inferno. São Paulo: 34 Letras, 2009.

______.  The son of a servant. The story of the evolution of a human being (1849- 67). London: Jonathan Cape Paperback, 1967.

______. O Sonho. Lisboa: Editorial Estampa, 1978.

______. Rumo a Damasco. São Paulo: Cone Sul, 1997.
 
 

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